Há algum tempo escrevi aqui sobre as cartografias colaborativas como uma forma de autoria em rede: mapas que são produzidos através da ação colaborativa de uma multidão de atores sociais, que trazem o registro de dados de interesse coletivo e se constituem em um bem comum, na medida em que contribuem para melhorias nos serviços públicos e privados; denúncias de problemas na cidade; registro de acervos culturais etc.
Tradicionalmente, a produção de mapas esteve relacionada à formação dos estados, com o objetivo de demarcar seu território, a localização de recursos etc. Sendo assim, se constituiu primeiramente como um processo centralizado, realizado a partir de decisões de instituições governamentais com o objetivo de atender a determinadas demandas geopolíticas.
No entanto, é importante salientar que a cartografia é antes de tudo uma representação do espaço, portanto passível de interpretação e dotada de viés político. Assim, o mapeamento feito pelo coletivo social tem o potencial de dar visibilidade a aspectos relevantes para a cidadania, mas que podem ser negligenciados pelo poder público.
Retornei a esse tema recentemente, nas apresentações que fiz no Acta Media 11, e desta vez pesquisei um pouco mais o caso Porto Alegre CC. Assim, pude perceber com mais clareza que o sucesso dessa iniciativa, que conta com centenas de registros sobre a cidade feitos por seus moradores, deriva do amadurecimento político-social da população local.
A plataforma foi lançada em março de 2011, como um projeto conjunto entre a prefeitura local e a Universidade de Vale dos Sinos, com o objetivo de incentivar o exercício da cidadania a fim de melhorar a qualidade de vida na cidade.
Importante destacar que o Porto Alegre CC faz parte de uma tecnologia social mais complexa, que vai além da plataforma virtual. Os registros feitos pelo público são acompanhados pela equipe que administra o projeto, com a realização de encontros periódicos e oficinas de capacitação social, com o intuito de dinamizar a participação popular em torno das demandas.
É evidente o legado da experiência do Orçamento Participativo como inspiração para esse projeto. Implantado de forma pioneira na cidade na década de 1980, para promover o debate público sobre as prioridades de investimento no município, essa metodologia de participação popular mais tarde se estendeu a dezenas de cidades brasileiras e também chegou ao exterior, em cidades como Montevidéu, Caracas, Buenos Aires e Lisboa.
Então, ao refletir sobre o papel das cartografias colaborativas com vistas à articulação social política, não se deve perder de vista que a mobilização é antes de tudo derivada da ação cidadã, isto é, o suporte tecnológico é apenas um elemento a mais no complexo processo de amadurecimento da sociedade democrática.
Abaixo, os slides de minha apresentação “Autoria e redes de comunicação: um olhar sobre as cartografias colaborativas”, no Acta Media 11, em Lisboa e São Paulo.